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Estilista transforma 'O Catarinão' em vestuário para Expofavela RJ

Sabrina, moradora do Jardim Catarina há 25 anos, aprendeu a costurar sozinha para ajustar roupas que ganhava de doação

Atualizado em 24/10/2025 às 23:10, por Marcyllene Maria e Samara Oliveira.

A imagem mostra Sabrina, uma jovem mulher branca de cabelo liso, escuro e longo sentada em uma cadeira de escritório rosa em uma bancada de trabalho em um ateliê de costura e criação. Ela veste uma jaqueta preta e calça cargo cinza escura e sorri para a câmera. Ao fundo, uma parede rosa de pegboard, máquina de costura e uma prateleira com carretéis coloridos de linha e um manequim preto. Em cima da mesa, há jornais, acessórios, tesouras e uma bolsa de vinil transparente estampada com jornal O Catarinão, assim como o corset feito de tecido e jornal O Catarinão.

É a primeira vez que a estilista consegue expor seu trabalho no evento | Foto: Synara Azevedo/O Catarinão

"Eu quero ir com uma coisa bem diferente que represente onde eu moro", foi com esse pensamento que Sabrina Cristhyan, de 32 anos, conhecida também como Japoneca, decidiu que ia reaproveitar os jornais impressos do O Catarinão para criar sua roupa e acessório para apresentar na ExpoFavela2025. O evento de negócios e inovação que conecta empreendedores de favelas com investidores e grandes empresas acontece neste final de semana, na Cidade das Artes.

Com objetivo de representar sua trajetória e território, mostrando como o seu trabalho gera impacto, Sabrina fez um Corset e uma bolsa com edições do jornal O Catarinão estampado em suas criações.

"Quero mostrar O Catarinão no próprio look, na bolsa, no corset e para as pessoas verem que a moda não é só o básico. É um mundo criativo e de possibilidades”, afirma a estilista.

No entanto, quem vê Japoneca criando suas peças, talvez não imagine a jornada por trás da estilista que se tornou. Moradora do Jardim Catarina há 25 anos, sua relação com as agulhas e linhas começou através da dificuldade. Ela encontrou na costura, que aprendeu sozinha aos 14 anos, não apenas uma profissão, mas um caminho para a autonomia e uma ferramenta para reescrever sua própria trajetória.

"Minha mãe não tinha dinheiro para comprar roupa (...) aí ganhava muita roupa", relembra Sabrina. As peças doadas, quase sempre grandes demais, eram o ponto de partida. "Eu pegava e começava a ajustar em casa mesmo, para eu não ir para a escola com aquela roupa feia, né?", conta.

Sabrina conta que sempre foi vaidosa e apesar de ter vivenciado uma infância difícil, sempre se preocupou em como se vestir bem. Antes de se mudar para o Jardim Catarina, onde o pai ergueu uma casa improvisada em que a família conviveu com a miséria, Sabrina viveu um episódio que marca sua vida até hoje: aos nove anos foi atingida por um tiro na nuca durante uma operação policial no Salgueiro.

O caso, que saiu em rede nacional, é hoje encarado por Sabrina como um símbolo de sua força: "Tem até um jornal bem antigo que eu guardo, que é meu testemunho de vida", relata.

Da faxina ao empreendedorismo

Sabrina já foi faxineira, cabeleireira formada - profissão que também atua até hoje - e até MC, mas o amor pela costura falou mais alto. A decisão de transformar o hobby em negócio veio depois da pandemia. "Eu pensei assim: preciso fazer alguma coisa para viver do que eu amo", afirma.
Ela investiu o dinheiro que tinha em máquinas e manequins e começou a produzir. O sucesso foi imediato.

"Eu ia para os lugares com as minhas roupas, aí as meninas perguntavam: 'Ah, você comprou aonde?' Eu falava: 'Eu que fiz'. Aí elas ficavam doidas (...) Aí comecei a vender".

Hoje, Sabrina vive exclusivamente da sua arte, tendo largado o emprego formal após a pandemia de COVID-19 e investido na sua marca. Essa mudança trouxe a tão sonhada autonomia e mais tempo de qualidade com a sua filha. 

"Eu me sinto realizada. Porque além de trabalhar dentro de casa, eu consigo cuidar da minha filha, ter mais autonomia, né? Mais tempo para mim (...) e dá para pagar minhas contas, isso é muito satisfatório. A gente tem que ser feliz com o que a gente gosta de viver".

Moda sustentável: Uma nova visão

O trabalho de Japoneca se divide entre a "moda balada" e o seu grande diferencial: a moda sustentável. Ou seja, criar roupas a partir do que muitos consideram lixo. É "uma nova visão da moda", como define a estilista, que prova através do seu trabalho que a criatividade não depende de materiais caros. 

"Moda sustentável" pode soar distante para alguns, mas a prática é antiga nas periferias. Antes mesmo de ganhar esse nome, o conceito já existia no talento de mães que customizavam as roupas doadas e na criatividade de quem transformava uma peça antiga em algo novo.

Você sabia?

O trabalho de Japoneca é focado no Upcycling (pronuncia-se "âpssaiclin"). Esse é um dos pilares da sustentabilidade.
Upcycling é o ato de "dar uma nova vida" a materiais que seriam descartados, transformando em algo de maior valor, sem destruir o material original. É diferente de reciclar (onde uma garrafa PET é derretida para virar outra coisa). No upcycling, pelas mãos da Japoneca, um jornal vira um corset; uma calça jeans rasgada vira uma bolsa estilosa.

"Quem vai imaginar que um jornal e um plástico vai virar um look icônico, né? Uma coisa diferente assim. Nem todo mundo consegue imaginar (...) 'Ah, um look é só tecido', não, pode usar outras matérias primas", explica a estilista como usar a criatividade para evitar o lixo.

Para os jovens que sonham em trabalhar com o que ama, Japoneca deixa um recado: "O que você acha que talvez não seja bom é o que você tem, as suas armas para você alcançar o seu sucesso. Aprender a observar as oportunidades que você tem e usar aquilo a seu favor".

A estilista aceita encomendas através do Instagram @japonecca e também através do WhatsApp (21)983277716.

Foto:Synara Azevedo/ O Catarinão
Foto:Synara Azevedo/ O Catarinão
Foto:Synara Azevedo/ O Catarinão
Foto:Synara Azevedo/ O Catarinão
Foto:Synara Azevedo/ O Catarinão